quarta-feira, 17 de abril de 2013

Produzo pouco porque percebo a arte intimamente relacionada a fatores históricos, sociais e políticos, e ao mesmo tempo, entendo que estes elementos não incidem sobre a arte de modo determinante, como se ela fosse nesse quadro desprovida de qualquer potência crítica, política e social. Toda obra de arte tem a ambição de ser mais do que o reflexo de seu próprio tempo. Por isso, ao invés de procurar trabalhar em um espaço autônomo, livre das interferências do meio, me interessa reconhecer criticamente as condições deste meio e, ainda que a nível micropolítico, propor sobre elas algumas transformações. Assim, se produzo pouco, é que ainda me sinto em reconhecimento dessas condições que sei serem complexas.

Eu almejo produzir boa arte. Sei que a expectativa de que alguém jovem produza boa arte seja romântica, ou reminiscente da época dos gênios, mas não me importo. Enfatizo o processo e a etapa reflexiva da pesquisa em meu trabalho porque acredito  que o período contemporâneo exige base sólida para a produção de boa arte. "Boa arte" não é mera pretensão ou ambição, mas obrigação de quem, desmistificando o termo, opta por viver de arte. Se ela está em toda parte, e qualquer um é, ou pode ser, artista - ainda que, ironicamente ou não, pela mera instituição (já que a experiência estética é noção em nossos dias muito vaga) -, então não faz muito sentido desejar tornar-se artista propondo meros trabalhos de arte. Se arte pode ser qualquer coisa, isso pode não significar muita coisa; mas, por essa mesma razão, o que ela pode chegar a significar? Esse é a meu ver o grande interesse da condição contemporânea. Ou será recriminável dedicar a vida à máxima significação possível?

As razões pelas quais já não pinto e desenho, não ao menos como antes, não são as tendências conceituais contemporâneas, como se o contexto artístico ditasse normas e assim regulasse a (minha) produção. Se esta tendência de fato existe, sei que em alguns nichos há também críticas favoráveis a essas produções mais tradicionais e com elas, um mercado aberto e ávido por esse tipo de produção. Meu real interesse de investigação está em outra parte; tem a ver com a identificação do meu pensamento na leitura de textos como os de Hal Foster. O que quero dizer com isso é que minha produção não pretende concordar com o pensamento dele, ou com a parcela do "mundo da arte" que possui com seu pensamento crítico alguma afinidade, mas com meu próprio pensamento que encontra no dele, por ora, oportunidade de clarear-se (não gosto dessa palavra, mas é a que me aparece agora). Ainda que saiba que, pelo próprio caráter estético da obra de arte, certa obscuridade seja inevitável (eu diria mesmo desejável), entendo que na maioria das vezes, pela própria complexidade do aparelho político e econômico que sustenta, essa obscuridade é responsável pela inocuidade da maior parte da produção contemporânea - penso mais em inocuidade crítica do que poética, embora meu interesse seja conjugar estas esferas. É este interesse, aliás, o que justifica minha orientação acadêmica para "poéticas visuais" e não para "teoria, história e crítica": embora a repartição não me interesse, o segundo campo me parece muito mais presente no primeiro, do que o primeiro no segundo.

Parte da minha produção resulta mais da pressão pela produção do que mais propriamente por um desejo "interno". Por que essa pressão existe? Por que me inseri num meio que é mais moderno do que contemporâneo (não nego que haja continuidade, mas negar distinções é negar a historicidade da arte). Por enquanto meu desejo se concretiza na produção destas linhas, motivo pelo qual elas fazem muito mais sentido como arte (arte-processo) do que, por ora, qualquer pintura, desenho ou vídeo. Não digo que seja boa arte, mas já que trata-se assumidamente de um trabalho em processo...faria mais sentido se este texto estivesse escrito à óleo, numa tela, em um museu?